quarta-feira, dezembro 28, 2005

Feliz 2006!

Sorri, enquanto olha pela janela por onde entram rodos de luz. Na mesa de madeira à sua frente está um "Moleskine" preto com uma caneta por entre as folhas. A sua idade é imprecisa, mas a sua cabeça é já coroada por um manto de finos cabelos brancos. Não nos é dado acesso aos seus pensamentos, mas no topo da página aberta encontra-se escrito com uma letra inserta, quase infantil, 2006. Depois, depois... muitas páginas escritas com muitas canetas diferentes. Nota-se que aquele pequeno caderno que jaz ali parado no tempo foi plenamente manipulado. Por entre as folhas nota-se o volume espesso de fotografias e outros papéis ali colocados na esperança de que não se perdessem. Era o futuro de hoje feito passado e memória.

A expressão dela é tranquila, como se tivesse muitos outros blocos semelhantes àquele, cobrindo muitos outros anos, até ao preciso momento em que assomamos na sua sala, invisíveis, para a ver pensar.

Talvez 2006 tenha sido um ano bom, cheio de viagens, livros e pessoas. Talvez ela o tenha retirado da estante porque sabia que nós a iríamos olhar, na esperança de saber através dos seus olhos tranquilos se ela é a pessoa que gostaria de ter sido, se fez tudo aquilo que um dia sonhou fazer, se existem mais coisas na sua vida de que se orgulha do que aquelas de que se arrepende...

A leitura não é imparcial. Apenas, a certeza de que faremos o nosso melhor. Porque afinal tudo o que importa é saber-se que se viveu plenamente a vida que se escolheu viver...

Feliz 2006!

domingo, dezembro 11, 2005

"Un jour, je rêvais que j'étais un papillon... Soudain, je m'éveillais... Maintenant, je ne sais pas si j'étais un homme rêvant qu'il était un papillon, ou si je suis maintenant un papillon rêvant qu'il est un homme."

Chuang-Tzu

domingo, dezembro 04, 2005

Perguntei-lhe se não se aborrecia nas longas horas que demora a correr uma maratona... Olhou-me com surpresa e respondeu: " Como é que alguém se pode aborrecer consigo mesmo? Sempre achei estranhas as pessoas que precisam de constante interferência do exterior para se distrairem de si próprias."

Interessante...

quarta-feira, novembro 30, 2005

domingo, novembro 27, 2005

As coisas que nos fazem bater o coração (1)

Estava a ler os "Périplos Imaginários", uma compilação das aguarelas de Hugo Pratt e lembrei-em! Hugo Pratt é, para quem não sabe, o criador de Corto Maltese. O pirata errante solitário e introspectivo, que seria o homem perfeito se não fosse apenas cores e água em papel branco. Enfim... não é de Corto Maltese que se trata este post, mas das coisas que fazem bater o coração. As aguarelas de Hugo Pratt são precisamente sobre isso... sobre o mar e mulheres bonitas, sobre as gaivotas e o deserto, sobre as pessoas... Estava portanto a ler o livro e lembrei-me...

Lembrei-me das coisas que me fazem bater o coração. Não propriamente das coisas, mas de como é importante sermos capazes de indicar as coisas que nos tocam tão profundamente que o nosso coração passa a bater de uma forma diferente. Não sou a primeira a falar sobre isto. O Brito fê-lo há muitos meses atrás...

Em todo o caso, a primeira coisa que me faz bater o coração é nova para mim: a NEVE. Descobri que tanto tempo depois ainda podemos sentir como uma criança, basta, tal como elas o são todos os dias, sermos expostos a uma situação enusitadamente nova. Cheguei ao escritório de olhos brilhantes e sorriso na voz, para lá das janelas a paisagem era de um branco encantado. As árvores e as coisas perdiam os contornos e a neve caía, silenciosamente, vestindo no seu silêncio o mundo de virgindade. É incrivelmente misterioso e belo!

As outras coisas (faltam 4!) seguirão mais tarde! Tenho que pensar...

E vocês... o que vos faz bater o coração?

sexta-feira, novembro 25, 2005

Os 5 melhores romances portugueses dos ultimos 30 anos

No Blog "da Literatura" fala-se dos 5 melhores romances portugueses dos últimos 30 anos. Fiquei assustada quando percebi que ainda me faltam ler uns quantos!!!

Para os curiosos, aqui fica a lista que resultou da votação de uns quantos blogs. Muitos ex-aequos a provar que a escolha não é fácil. A validade é a que é, mas sempre é um ponto de partida. Sugestões a acrescentar?

1. Memorial do Convento, José Saramago, 1982
2. Para Sempre, Vergílio Ferreira, 1983
3. (ex-aequo) Sinais de Fogo, Jorge de Sena, 1979
3. (ex-aequo) Alexandra Alpha, José Cardoso Pires, 1987
4. (ex-aequo) O que diz Molero, Dinis Machado, 1977
4. (ex-aequo) Lucialima, Maria Velho da Costa, 1983
4. (ex-aequo) Adeus, Princesa, Clara Pinto Correia, 1985
5. (ex-aequo) Os Cus de Judas, António Lobo Antunes, 1979
5. (ex-aequo) Balada da Praia dos Cães, José Cardoso Pires, 1982
5. (ex-aequo) O Ano da Morte de Ricardo Reis, José Saramago, 1984
5. (ex-aequo) Manual dos Inquisidores, António Lobo Antunes, 1996

ESTÁ A NEVAR!!!!

quarta-feira, novembro 23, 2005

Leote, Leotte ou Liote

Lembrei-me de procurar na net o que dizia o grande mundo "internáutico" sobre mim própria. Que tal?



"De verde, com um braço armado de prata, movente do flanco esquerdo e com a mão de carnação, segurando pela orelha uma cabeça de leão de ouro, arrancada e ensanguentada."

terça-feira, novembro 22, 2005

High fidelity

Falaram no livro e eu não resisti a rever o filme. :-)

Para quem está na crise dos 20 e qualquer coisa, funciona como"placebo": inofensivo ainda que ajude a curar alguns males à custa de sorrisos e perspectiva. Às vezes é o que nos falta, certo?

Resolvi procurar na net algo mais sober o filme homónimo do livro de Nick Hornby e descobri, nem mais nem menos que o guião do filme... aqui fica o link para os que tiverem curiosos...

E um pequeno DELICIOSO excerto!!!!


ROB
(to camera)
Over nine million men in this
country have slept with ten or more
women. And do they all look like
Richard Gere? Are they all as rich
as Bill Gates? Charming as Oscar
Wilde? Hell no. Nothing to do
with any of that. Maybe fifty or
so have one or more of these
attributes, but that still
leaves...well, about nine million,
give or take fifty. And they're
just men. Regular guys.
We're just guys, because I, even I,
am a member of this exclusive, nine
million member club. In fact,
Marie is my seventeenth lover. "How
does he do it?" you ask. "He wears
bad sweaters, he's grumpy, he's
broke, he hangs out with the
Musical Moron Twins, and he gets to
go to bed with a recording artist
who looks like Susan Dey-slash-Meg
Ryan. What's going on? Listen up,
because I think I can explain, with
all modesty aside: I ask questions.
That's it. That's my secret. It
works precisely because that isn't
how you're supposed to do it, if
you listen to the collective male
wisdom. There are still enough
old-style, big-mouthed, egomaniacs
running around to make someone like
me appear to be refreshingly
different. If you can't hack this
simple strategy, there are some
women out there, of course, who
want to get pushed around, ignored
and mowed over, but do you really
want to be with them anyway?

Ouviram meninos?

sábado, novembro 19, 2005

O impensável





Tudo pronto... malas feitas e bilhete na mão. Um fim de semana fantástico em Paris pela frente!!! Então acontece o impensável... enquanto procurávamos os lugares numa carruagem apinhada de gente, ao darmos com pessoas nos nossos lugares, resolvemos dizer educadamente que desculpávamos mas...sabe como é... esses lugares são nossos... pode confirmar aqui no nosso bilhete. Sim, sim... a carruagem é esta e o lugar pois...como vê é aqui mesmo. E assim continuamos quando resolvemos comparar os nossos bilhetes. E então descobrimos o impensável. A carruagem era aquela, assim como os lugares. Mas a data, a data senhores... era de há um mês atrás!!!...

O comboio quase a partir e nós no cais desconsolados. Voltar para casa, desfazer as malas e ir jantar no mesmo sítio de sempre... E Paris, fica para a próxima.

quinta-feira, novembro 17, 2005

Aahhhh!!!!!!

Deslumbramento de alguns... o primeiro nevão caiu ontem nas montanhas. Ao meio-dia a neve era, no entanto, já quase imperceptível. Apesar disso, este facto significa para muitos: os fim-de-semanas de ski, os fondues nos challets, as montanhas brancas, acordar as 7da manhã para ir esquiar. Enfim... o INVERNO!!!!

Está mesmo à porta: o termómetro do meu carro já marcou zero graus.

quarta-feira, novembro 16, 2005

Just smile!



Calvin & Hobbes by "Bill Watterson"

sábado, novembro 12, 2005

Eternal sunshine of the spotless mind

Lembra-se do "Being John Malkovich"? e do "Adaptation"? Gostaram? Pois bem.., então não percam "Eternal sunshine of the spotless mind" com o Jim Carrey and Kate Winslet. Eu sei... os autores podem não parecer o mais prometedor, mas Jim Carrey consegue sair completamente do usual papel de engraçado idiota para um filme completamente inesperado. A provar que as histórias de amor podem ser contadas de muitas maneiras...

Para uma noite descontraída. Bom fim de semana.

segunda-feira, novembro 07, 2005

RHINO

Et voilá... a cidade de todos os capitalismos vibra sob o jugo das trombetas, baterias, saxofones. Desfilam pela rua, lenços na cabeça, bicicletas apodrecidas, cabelos longos e despenteados, óculos de massas, velhos casacos militares. Elas têm o cabelo pintado. Talvez usem uma camisola com riscas coloridas. Vê-se uma crista "démodé" aqui e ali.

A cidade de todos os capitalismos pára um pouco o seu afã de compras para os ver passar. Não gritam. As suas palavras estão na música que tocam, nos cartazes que empunham, nas máscaras que levam. São OKUPAS. No edifício ocupado criaram uma associação de apoio às artes e à cidade trazem o colorido que os fatos sérios, dos senhores sérios, que fazem os negócios sérios deste mundo não poderiam ter.

E naquele sábado (que poderia ter sido igual a tantos outros!)... o povo saiu à rua, a cidade parou para os ver passar e foi-se juntando ao longo do caminho para dançar ao som da música ou para simplesmente sentir o movimento. E afinal... a manifestação dos barbudos vermelhos foi uma festa de rua, com gente, muita gente, a provar que a cidade de todos os capitalismos é afinal uma aldeia cheia de vida!

Home is where the heart is

Em duas semanas, esta máxima chegou-me pela escrita de duas pessoas diferentes. Achei curioso. Minha pergunta da volta... não estará o nosso coração fragmentado e "em busca" até chegarmos a casa, seja ela onde e como for?

By the way... primeira noite verdadeiramente outonal. Depois das árvores douradas nos mais variados tons de vermelho, hoje chegou a vez do vento frio na cara, das mãos que se colocam nos bolsos à procura de calor, do cachecol que se lamenta ter deixado em casa. Vim a pé... o frio do ar foi um banho revigorante a lembrar que tudo tem um tempo e agora é tempo de Outono, de magusto e castanhas quentinhas.

domingo, novembro 06, 2005

Duas dicas musicais para a semana

Primeira Dica: Depeche Mode -> Playing the angel ...para revisitar o espírito dos anos 80!

Segunda Dica: Para os que gostam de música e querem saber mais visitem o blog Coisas do Puto e do Tipo. Descoberto nas minhas vadiagens pela net, vale a pena uma visita.

sexta-feira, novembro 04, 2005

Twenty something

Hoje não resisto... palavras para quê... muitos de nós têm precisamente isso: 20 e qualquer coisa. Cliquem e digam lá se não vos soa familiar :-)

"Love ain’t the answer nor is work,
the truth eludes me so much it hurts.
But I’m still having fun and I guess that's the key,
I'm a twenty something and I'll keep being me."
Jamie Cullum - Twenty something

quinta-feira, novembro 03, 2005

Porque há vidas intemporais...

Imaginem o José António Saraiva. Conseguem imaginar? O velho senhor que dá lições de história a senhoras improváveis. Pois bem... agora imaginem o mesmo José António Saraiva na figura de uma jovem extrovertida, a rondar os seus 90 anos e a falar francês numa velocidade pouco saudável para tão avançada idade. Os gestos têm a mesma expressão algo exagerada, mas a voz, a jovialidade, a empolgamento com que fala e que se sente vibrar em cada palavra que diz, são uma espécie de espectáculo em si mesmo que nos mantém presos, sem noção do tempo que passa... "Vocês têm que se imaginar no estúdio do Delacroix, espadas e sabres por todo o lado e as concubinas e a bela Simone. Não imaginam o que ele dizia no seu diário sobre a bela Simone, que pousava para ele por oito francos. Têm que estar lá se querem compreender. Toda a arte está localizada num tempo. Se a querem compreender têm que compreender as preocupações dos artistas, conhecer os seus amigos, as cidades por onde caminhavam, as conturbações políticas, religiosas, as modas. É por isso que eu preciso de vos explicar tudo isto."

Belo, não é? A idade não tem faces ou rugas ou tempos. Mesmo se se fazem esboços em vez de se tirarem fotografias, mesmo se se conduz um carro apenas com duas mudanças ( a saber, 1a e 2a), mesmo se depois de insinuações menos próprias sobre Delacroix e a devassidão do seu estúdio se diz com o ar mais sério do mundo: "Meninas da sua idade não podem andar sozinhas a esta hora na rua". Porque o tempo era outro e estávamos outra vez no séc. XXI. No entanto, havia um brilho no olhos e uma empolgamento na voz que não enganava ninguém. A vida é intemporal e instintivamente reconhecemos aqueles que conseguem viver plenamente essa sua característica...

quarta-feira, novembro 02, 2005

Dieu a inventé le chat pour que l'homme ait un tigre à caresser à la maison

"Dieu a inventé le chat pour que l'homme ait un tigre à caresser à la maison" Victor Hugo

Hoje chegou finalmente o dia! Ela chegou com uns passinhos arrogantes e a presa na boca. O zzzzz constante não deixava muito espaço para enganos, o mesmo se passava com a cor esverdeada. Podia ter sido pior: um rato, talvez um passarinho mais desprecavido... Era apenas um pequeno gafanhoto. Foi um bom jantar. Disse-me ela enquanto ronronava às minhas pernas.

(Ggbbrrr... o que farei quando começar a ter cadáveres pela casa????)

segunda-feira, outubro 24, 2005

LE CRÉPUSCULE DU SOIR

Voici le soir charmant, ami du criminel;
ll vient comme un complice, à pas de loup: le ciel
Se ferme lentement comme une grande alcôve,
Et l'homme impatient se change en bête fauve.
O soir, aimable soir, désiré par celui
Dont les bras, sans mentir, peuvent dire: Aujourd'hui
Nous avons travaillé! - C'est le soir qui soulage
Les esprits que dévore une douleur sauvage,
Le savant obstiné dont le front s'alourdit,
Et l'ouvrier courbé qui regagne son lit.
Cependant des démons malsains dans l'atmosphère
S'éveillent lourdement, comme des gens d'affaire,
Et cognent en volant les volets et l'auvent.
A travers les lueurs que tourmente le vent
La Prostitution s'allume dans les rues;
Comme une fourmilière elle ouvre ses issues;
Partout elle se fraye un occulte chemin,
Ainsi que l'ennemi qui tente un coup de main;
Elle remue au sein de la cité de fange
Comme un ver qui dérobe à l'Homme ce qu'il mange.
On entend çà et là les cuisines siffler,
Les théâtres glapir, les orchestres ronfler;
Les tables d'hôte, dont le jeu fait les délices,
S'emplissent de catins et d'escrocs, leurs complices,
Et les voleurs, qui n'ont ni trêve ni merci,
Vont bientôt commencer leur travail, eux aussi,
Et forcer doucement les portes et les caisses
Pour vivre quelques jours et vêtir leurs maîtresses.

Recueille-toi, mon âme, en ce grave moment,
Et ferme ton oreille à ce rugissement.
C'est l'heure où les douleurs des malades s'aigrissent!
La sombre Nuit les prend à la gorge; ils finissent
Leur destinée et vont vers leur gouffre commun;
L'hôpital se remplit de leurs soupirs. - Plus d'un
Ne viendra plus chercher la soupe parfumée,
Au coin du feu, le soir, auprès d'une âme aimée.

Encore la plupart n'ont-ils jamais connu
La douceur du foyer et n'ont jamais vécu!

Charles Baudelaire (1852)


Aqui também a noite chegou. Lá fora talvez andem os ladrões e as prostitutas de Baudelaire acompanhados das pequenas multidões que passam alegres. Eu sou mais o obreiro cansado. O dia de hoje passou. Até amanhã.

sábado, outubro 22, 2005

Elementos mágicos

Ontem ao jantar falava-se de cheiros e da sua capacidade para instantâneamente nos levarem a locais e tempos distantes. Não consigo deixar de pensar que essa capacidade quase mágica é comum a todas as coisas que, por nos terem tocado se emiscuiram na nossa vida até serem parte de nós. Não interessa portanto, quanto tempo passe ou se ficámos ou partimos. Levamos essas sementes connosco e um dia quando menos esperamos a magia acontece e recuamos muito tempo para outros jantar, para amigos perdidos ou sempre presentes, para viagens ou simplesmente para um determinado estado de espírito. Às vezes (como aliás tudo o que é importante), o elemento mágico não passa de um detalhe, um pedaço de uma conversa, uma música, uma luz mais especial, que afinal não tinhamos esquecido e nem nos lembravamos das saudades que tínhamos.

Bom fim de semana.

quarta-feira, outubro 19, 2005

Chegar a casa

Sabemos que estamos ambientados a um sítio quando depois de uns dias difíceis dizemos para nós, com um suspiro...já estou em casa... E quando olhamos à volta, verificamos que o sítio a que chamamos casa, não é mais do que aquele que até há bem pouco tempo era apenas um local estranho e frio.

Sabe bem chegar a casa... Sabe bem reconhecer no sítio que habitamos a nossa casa. Quantas casas, em toda esta dimensão afectiva e emocional poderemos ter na nossa vida? Será que é apenas o hábito que nos faz chamar casa ao local que habitamos? Será a sensação de protecção, as coisas, livros, papéis, desarrumação que nos são comuns? Será que o nosso conceito de casa muda com o tempo? Será mais que um espaço físico? Uma pessoa? Um estado de espírito? Poderá uma estação no meio da China Central ser a casa para o viajante que aí pernoita?

Não sei... mas hoje, suspirando, soube-me bem chegar a casa.

segunda-feira, outubro 17, 2005

Adiamento

Depois de amanhã, sim, só depois de amanhã...
Levarei amanhã a pensar em depois de amanhã,
E assim será possível; mas hoje não...
Não, hoje nada; hoje não posso.
A persistência confusa da minha subjetividade objetiva,
O sono da minha vida real, intercalado,
O cansaço antecipado e infinito,
Um cansaço de mundos para apanhar um elétrico...
Esta espécie de alma...
Só depois de amanhã...
Hoje quero preparar-me,
Quero preparar-rne para pensar amanhã no dia seguinte...
Ele é que é decisivo.
Tenho já o plano traçado; mas não, hoje não traço planos...
Amanhã é o dia dos planos.
Amanhã sentar-me-ei à secretária para conquistar o rnundo;
Mas só conquistarei o mundo depois de amanhã...
Tenho vontade de chorar,
Tenho vontade de chorar muito de repente, de dentro...

Não, não queiram saber mais nada, é segredo, não digo.
Só depois de amanhã...
Quando era criança o circo de domingo divertia-rne toda a semana.
Hoje só me diverte o circo de domingo de toda a semana da minha infância...
Depois de amanhã serei outro,
A minha vida triunfar-se-á,
Todas as minhas qualidades reais de inteligente, lido e prático
Serão convocadas por um edital...
Mas por um edital de amanhã...
Hoje quero dormir, redigirei amanhã...
Por hoje, qual é o espetáculo que me repetiria a infância?
Mesmo para eu comprar os bilhetes amanhã,
Que depois de amanhã é que está bem o espetáculo...
Antes, não...
Depois de amanhã terei a pose pública que amanhã estudarei.
Depois de amanhã serei finalmente o que hoje não posso nunca ser.
Só depois de amanhã...
Tenho sono como o frio de um cão vadio.
Tenho muito sono.
Amanhã te direi as palavras, ou depois de amanhã...
Sim, talvez só depois de amanhã...

O porvir...
Sim, o porvir...

Álvaro de Campos

domingo, outubro 16, 2005

Luminarium



Fantástico, não é? E na realidade é apenas uma tenda de ar, plástico e cor! Fiquem atentos à agenda dos Arquitectos do Ar, porque vale a pena. Ahh... e não se esqueçam da máquina fotográfica. Os resultados são imprevisíveis...

Boa semana!

terça-feira, outubro 11, 2005

(...)


Calvin & Hobbes by Bill Watterson

segunda-feira, outubro 10, 2005

Mistério (por Florbela Espanca)

Gosto de ti, ó chuva, nos beirados,
Dizendo coisas que ninguém entende!
Da tua cantilena se desprende
Um sonho de magia e de pecados.

Dos teus pálidos dedos delicados
Uma alada canção palpita e ascende,
Frases que a nossa boca não aprende,
Murmúrios por caminhos desolados.

Pelo meu rosto branco, sempre frio,
Fazes passar o lúgubre arrepio
Das sensações estranhas, dolorosas…

Talvez um dia entenda o teu mistério…
Quando, inerte, na paz do cemitério,
O meu corpo matar a fome às rosas!

domingo, outubro 09, 2005

COLORS 65

"Attention. Reading the pages of COLORS 65 may put you at serious risk depending on your location at the present time."

É assim que se inicia o número 65 da revista COLORS editada pela Benetton. Toda focada na problemática da liberdade de imprensa, vale a pena a leitura. Devolve-nos a perspectiva! Afinal, nós próprios e os países que nos rodeiam e que temos a tendência de tomar como exemplo, ainda temos um longo caminho a percorrer para assegurar que a liberdade de imprensa é um facto e não uma mera discussão teórica.

Por curiosidade... no ranking da liberdade de imprensa, Portugal encontra-se em 25º, atrás da Jamaica!, mas muito à frente de países como a Itália ou a Espanha (ambos em 39º). No final da lista encontra-se a Coreia do Norte.

Boa semana.

domingo, outubro 02, 2005

Cinemateca Portuguesa em 2003

Continuam as descobertas... desta feita um programa da Cinamateca Portuguesa, imagine-se de 2003... E de novo aquela viagem rápida no tempo até ao dia em que peguei no pequeno papel e o enfiei descuidadamente na mala de mão que trazia nesse dia. Mundos se passaram desde então. Hoje é tudo diferente! Por algum motivo a, a mala, nunca mais usada, passou todo este tempo esquecida mas acompanhando-me à medida que a vida me fazia mudar de um sítio para o outro. Uma nota do passado, para lembrar os nadas de que somos feitos.

Por curiosidade: em Fevereiro de 2003 passou na Cinamteca portuguesa o filme "Goodfellas" - Tudo bons rapazes, de Martin Scorcese. Se não viram, aqui fica uma sugestão descontraída para a semana.

sábado, outubro 01, 2005

Lembram-se?

Em todas as vidas, há sempre pequenos detalhes que ao darmos por eles nos arrancam sentimentos contraditórios. As despedidas são um deles. Reúnem em si a agitação da partida e a certeza reconfortante que há pessoas às quais nunca se diz adeus, apenas até à próxima. Essa evocação é tanto mais poderosa quando é feita através de papéis esquecidos numa caixa, ou quando qualquer coisa, qual madalena de Proust, nos faz recordar... Passaram seis meses. Lembram-se?

Segue o teu destino,
Rega as tuas plantas,
Ama a tuas rosas.
O resto é a sombra
De árvores alheias.

A realidade
Sempre é mais ou menos
Do que nós queremos.
Só nós somos sempre
Iguais a nós próprios.

Suave é viver só.
Grande e nobre é sempre
Viver simplesmente.
Deixa a dor nas aras
Como ex-voto aos deuses.

Vê de longe a vida.
Nunca a interrogues.
Ela nada pode
Dizer-te. A resposta
Está alem dos deuses.

Mas serenamente
Imita o Olimpo
No teu coração.
Os deuses são deuses
Porque não se pensam.

Ricardo Reis, 1916

sexta-feira, setembro 30, 2005

Há semanas assim!

For everything there is a season,
And a time for every matter under heaven:
A time to be born, and a time to die;
A time to plant, and a time to pluck up what is planted;
A time to kill, and a time to heal;
A time to break down, and a time to build up;
A time to weep, and a time to laugh;
A time to mourn, and a time to dance;
A time to throw away stones, and a time to gather stones together;
A time to embrace, And a time to refrain from embracing;
A time to seek, and a time to lose;
A time to keep, and a time to throw away;
A time to tear, and a time to sew;
A time to keep silence, and a time to speak;
A time to love, and a time to hate,
A time for war, and a time for peace.

Ecclesiastes 3:1-8


Amanhã é sábado! Boa noite.

domingo, setembro 25, 2005

Elogio aos Domingos

Os Domingos são talvez, excluindo as 6as feiras, os melhores dias da semana. São assim... como que cheios de tempo. Devolvem-nos o ritmo que a semana não nos concede. Os Domingos são bons porque podemos ficar na cama até à hora de almoço. No sábado há sempre uma infinidade de coisas para fazer: há que levantar cedo, ir às compras, o encontro com o amigo x e o jantar com a amiga Y antes da ida ao teatro. Ao Domingo não!... Acordamos e tomamos consciência à medida que os móveis tomam forma perante os nossos olhos de que não há planos e podemos ficar ainda, até que a preguiça do nosso corpo nos permita, ficar estendidos entre os lençóis. E depois, saimos para comprar o jornal trazendo no caminho pão ainda morno.

Ao Domingo todas as preguiças são permitidas. Se estiver a chover lá fora, um bom filme (de preferência antigo e mil vezes revisto!) em conjunto com uma chávena de chá fazem as delícias dos domingueiros convictos. Pelo contrário, se estiver Sol, abre-se todo um conjunto de possibilidades que vão desde uma tarde pachorrenta numa esplanada a ler o jornal; a um passeio de bicicleta, um cinema, ou...

Amanhã é 2a. O despertador tocará impiedosamente cedo pela manhã. Os ritmos irão impôr-se novamente. Do Domingo que agora termina guarda-se a memória do tempo dedicado ao sonho e aos pequenos luxos que nos esquecemos de dar a nós próprios durante todos os outros dias, como um chá numa esplanada a ver as folhas já castanhas das árvores sobranceiras voarem com o vento.

Boa semana!

sábado, setembro 24, 2005

Loucos...

Parava no café quando eu lá estava
Na voz tinha o talento dos pedintes
Entre um cigarro e outro lá cravava
a bica, ao melhor dos seus ouvintes

As mãos e o olhar da mesma cor
Cinzenta como a roupa que trazia
Num gesto que podia ser de amor
Sorria, e ao sorrir agradecia

São os loucos de Lisboa
Que nos fazem recordar
A Terra gira ao contrário
E os rios correm para o mar

Um dia numa sala do quarteto
Passou um filme lá do hospital
Onde o esquecido filmado no gueto
Entrava como artista principal

Compramos a entrada p'ra sessão
Pra ver tal personagem no écran
O rosto maltratado era a razão
De ele não aparecer pela manhã

Mudamos muita vez de calendário
Como o café mudou de freguesia
Deixamos de tributo a quem lá pára
Um louco a fazer-lhe companhia

E sempre a mesma posse o mesmo olhar
De quem não mede os dias que vagueam
Sentado la continua a cravar
Beijinhos as meninas que passeiam.

Ala dos Namorados (Música: João Gil, Letra: João Monge)

sexta-feira, setembro 23, 2005

Bom fim de semana!



Não fiquem em casa!

Do outro lado


"The false mirror" (1928), Magritte

Para aquelas vezes em que vemos o mundo refletido em nós.


PS - O MoMA em NY resolveu colocar a sua exposição on-line. Vale a pena espreitar o site e guardar a obra do vosso pintor/ fotógrafo/ escultor à distância de um clic e sem viagem de avião :-)

quinta-feira, setembro 22, 2005

Portrait of a turquish family

"Portrait of a turkish family" de Irfan Orga é o livro ideal para quem quer aprender um pouco mais sobre o que foi viver em Istambul ao longo do século XX. É um livro feito dos pequenos detalhes de que a vida de uma criança é feita. Delicioso, lê-se de um trago. O escritor é originário de Istambul, ainda que tenha vivido grande parte da sua vida adulta exilado em Londres. Foi em inglês que o livro foi escrito, não deixando, apesar de tudo, de exalar todos os ritmos arábicos.

A história de como este livro me veio parar às mãos é interessante.Foi-me aconselhado numa livraria na baixa da cidade chamada simplesmente "Bookstore". Entrei, atraída pelos livros em inglês sobre a turquia. Não sabia bem o que ía à procura. Sabia que queria entender melhor a história e o ambiente da cidade. A rapariga aconselhou-mo dizendo que eu ia adorar. Perante o meu ar incrédulo, disse-me. "Não acredita? Pois olhe todos os postais que eu recebi de outras pessoas a quem o aconselhei." Os postais eram um pouco de todo o mundo e todos eram unânimes dos elogios que faziam. Resolvi arriscar. Não me arrenpendi. Mas não escrevi nenhum postal. Fui-lho dizer pessoalmente antes de deixar a cidade.

Se um dia forem a Istambul, coloquem este livro na vossa bagagem. Ou melhor... vão à "Bookstore" e falem um bocadinho com a rapariga que lá está. Verão os olhos dela a brilhar a falar da sua cidade e do seu país e ficarão com vontade de ler mais e compreender melhor. Leiam o livro nos intervalos da vossa vagabundeagem pela cidade num dos muitos tea-garden. Acompanhado, claro está de um chá turco açucarado, servido num copo de vidro transparente com a forma de uma túlipa delicada. Leiam-no e tentem imaginar, as mulheres discretas e veladas a caminhar pela cidade, os vendedores que apregoavam um pouco de tudo pelas esquinas, os pobres e os mendigos, as mesquitas cheias, as festas da circuncisão, as casas de madeira e o Bósforo...

Boa viagem.

terça-feira, setembro 20, 2005

MEC

Não resisti... depois do "Elogio ao Amor" me ter chegado às mãos, encontrei o site do Miguel Esteve Cardoso. Caótico, mas delicioso. Aparentemente um punhado de drogas para o mau humor. Aconselho uma vista de olhos. Lembrou-me vagamente o Almada. Claro que muitos anos depois e com muitas asneiras à mistura. É bom saber!

http://www.pastilhas.com

Boa noite!

Elogio ao Amor

Arriscando-me a ser lamechas, não resisti...

Elogio ao Amor, por Miguel Esteves Cardoso

Há coisas que não são para se perceberem. Esta é uma delas. Tenho uma coisa para dizer e não sei como hei-de dizê-la. Muito do que se segue pode ser, por isso, incompreensível. A culpa é minha. O que for incompreensível não é mesmo para se perceber. Não é por falta de clareza. Serei muito claro.
Eu próprio percebo pouco do que tenho para dizer. Mas tenho de dizê-lo. O que quero é fazer o elogio do amor puro. Parece-me que já ninguém se apaixona de verdade. Já ninguém quer viver um amor impossível. Já ninguém aceita amar sem uma razão. Hoje as pessoas apaixonam-se por uma questão de prática. Porque dá jeito. Porque são colegas e estão ali mesmo ao lado. Porque se dão bem e não se chateiam muito. Porque faz sentido. Porque é mais barato, por causa da casa. Por causa da cama. Por causa das cuecas e das calças e das contas da lavandaria.
(...) Nunca vi namorados tão embrutecidos, tão cobardes e tão comodistas como os de hoje. Incapazes de um gesto largo, de correr um risco, de um rasgo de ousadia, são uma raça de telefoneiros e capangas de cantina, malta do "tá bem, tudo bem", tomadores de bicas, alcançadores de compromissos, bananóides, borra-botas, matadores do romance, romanticidas.
Já ninguém se apaixona? Já ninguém aceita a paixão pura, a saudade sem fim, a tristeza, o desequilíbrio, o medo, o custo, o amor, a doença que é como um cancro a comer-nos o coração e que nos canta no peito ao mesmo tempo? O amor é uma coisa, a vida é outra. O amor não é para ser uma ajudinha. Não é para ser o alívio, o repouso, o intervalo, a pancadinha nas costas, a pausa que refresca, o pronto-socorro da tortuosa estrada da vida, o nosso "dá lá um jeitinho sentimental".
Odeio esta mania contemporânea por sopas e descanso. Odeio os novos casalinhos. Para onde quer que se olhe, já não se vê romance, gritaria, maluquice, facada, abraços, flores. O amor fechou a loja. Foi trespassada ao pessoal da pantufa e da serenidade. Amor é amor. É essa beleza. É esse perigo. O nosso amor não é para nos compreender, não é para nos ajudar, não é para nos fazer felizes. Tanto pode como não pode. Tanto faz. É uma questão de azar. O nosso amor não é para nos amar, para nos levar de repente ao céu, a tempo ainda de apanhar um bocadinho de inferno aberto. O amor é uma coisa, a vida é outra. A vida às vezes mata o amor. A "vidinha" é uma convivência assassina. O amor puro não é um meio, não é um fim, não é um princípio, não é um destino. O amor puro é uma condição. Tem tanto a ver com a vida de cada um como o clima. O amor não se percebe. Não é para perceber. O amor é um estado de quem se sente. O amor é a nossa alma. É a nossa alma a desatar. A desatar a correr atrás do que não sabe, não apanha, não larga, não compreende. O amor é uma verdade. É por isso que a ilusão é necessária. A ilusão é bonita, não faz mal. Que se invente e minta e sonhe o que quiser. O amor é uma coisa, a vida é outra. A realidade pode matar, o amor é mais bonito que a vida. A vida que se lixe. Num momento, num olhar, o coração apanha-se para sempre. Ama-se alguém. Por muito longe, por muito difícil, por muito desesperadamente. O coração guarda o que se nos escapa das mãos. E durante o dia e durante a vida, quando não esta lá quem se ama, não é ela que nos acompanha - é o nosso amor, o amor que se lhe tem. Não é para perceber. É sinal de amor puro não se perceber, amar e não se ter, querer e não guardar a esperança, doer sem ficar magoado, viver sozinho, triste, mas mais acompanhado de quem vive feliz. Não se pode ceder. Não se pode resistir. A vida é uma coisa, o amor é outra. A vida dura a vida inteira, o amor não. Só um mundo de amor pode durar a vida inteira. E valê-la também.

Elogio ao amor (Miguel Esteves Cardoso - Expresso )

segunda-feira, setembro 19, 2005

Paradoxal



"-Oh, diabo!... E eu que disse ao Vilaça e aos rapazes para estarem no Braganza, pontualmente às seis! Não aparecer por aí uma tipóia!...
-Espera!- exclamou Ega.- Lá vem um "americano", ainda o apanhamos.
-Ainda o apanhamos!
Os dois amigos lançaram o passo, largamente. E Carlos, que arrojara o charuto, is dizendo na aragem fina e fria que lhes cortava a face:
-Que raiva ter esquecido o paiozinho! Enfim, acabou-se. Ao menos assentamos a teoria definitiva da existência. Com efeito, não vale a pena fazer um esforço, correr com ânsia para coisa alguma.
Ega, ao lado, ajuntava, ofegante, atirando as pernas magras:
-Nem para o amor, nem para a glória, nem para o dinheiro, nem para o poder...
A lanterna vermelha do "americano", ao longe, no escuro, parara. E foi em Carlos e em João da Ega um esperança, outro esforço:
-Ainda o apanhamos!
-Ainda o apanhamos!
De novo a lanterna deslizou e fugiu. Então para apanhar o "americano", os dois amigos romperam a correr desesperadamente pela Rampa dos Santos e pelo Aterro, sob a primeira claridade do luar que subia."

Eça de Queirós, Os Maias

domingo, setembro 18, 2005

Saudades de Lisboa


Lisbon Revisited

[...]

Outra vez te revejo,
Cidade da minha infância pavorosamente perdida...
Cidade triste e alegre, outra vez sonho aqui...

Eu? Mas sou eu o mesmo que aqui vivi, e aqui voltei,
E aqui tornei a voltar, e a voltar.
E aqui de novo tornei a voltar?
Ou somos todos os Eu que estive aqui ou estiveram,
Uma série de contas-entes ligados por um fio-memória,
Uma série de sonhos de mim de alguém de fora de mim?

Outra vez te revejo,
Com o coração mais longínquo, a alma menos minha.

Outra vez te revejo - Lisboa e Tejo e tudo -,
Transeunte inútil de ti e de mim,
Estrangeiro aqui como em toda a parte,
Casual na vida como na alma,
Fantasma a errar em salas de recordações,
Ao ruído dos ratos e das tábuas que rangem
No castelo maldito de ter que viver...

Outra vez te revejo,
Sombra que passa através das sombras, e brilha
Um momento a uma luz fúnebre desconhecida,
E entra na noite como um rastro de barco se perde
Na água que deixa de se ouvir...

Outra vez te revejo,
Mas, ai, a mim não me revejo!
Partiu-se o espelho mágico em que me revia idêntico,
E em cada fragmento fatídico vejo só um bocado de mim -
Um bocado de ti e de mim!...

Álvaro de Campos

domingo, setembro 11, 2005

Istambul - A cidade das fronteiras



Istambul é uma cidade que se encontra no limiar de muitas fronteiras. É isso que lhe dá o gosto, o colorido e o fascínio que ao longo de séculos encantou os viajantes que nela se refugiaram.

Dizem que Istambul é a única cidade do mundo que cruza dois continentes... De um lado a Europa, do outro lado, muito perto, a Ásia. Há pessoas que vivem num continente, trabalham no outro. As influências estão por todo o lado... Istambul é uma cidade que se procura aproximar da Europa dando sinais de abertura e desenvolvimento e ao mesmo tempo está repleta do cheiro, umas vezes acre, outras doce, das suas especiarias. Os transportes públicos são modernos mas os velhos sentam-se ainda à porta das suas pequenas lojas enquanto jogam gamão e bebem chá ininterruptamente. Os homens nunca chegaram a perder a sua faceta de negociantes de outros tempo, numa cidade em que apesar da europeização nenhum preço está marcado. São dois continentes que se cruzam ali mesmo, de cada lado desse Bósforo que durante milénios viu invasões e imperadores a nascerem e a caírem.

Porque Istambul é uma cidade que está também na fronteira da história. De um ponto alto, quando o barulho dos carros se torna um som distante e a nossa vista abarca a silhueta daquela cidade coroada de orgulhosos minaretes que a nós, como a tantos outros, nos obrigam a erguer os olhos para o céu, não é difícil imaginar Ali Baba e os sultões das 1001 noites. Caminhando pelo palácio, os olhos deslumbram-se com a riqueza e elegância dos mármores coloridos, a dimensão do harém, a vista das suas varandas e jardins, a piscina de mármore branco, os tectos cobertos de delicados azulejos, as paredes rendilhadas, trabalhadas pelos mais habilidosos artistas daquele tempo. É fácil imaginar génios da lâmpada e tapetes voadores. É fácil imaginar sultões tiranos nas suas calças em balão, com as suas 300 concubinas escolhidas entre as mais belas mulheres do império e encerradas em salas de ouro e mármore. Mas isso são sonhos que atravessam a mente quando a deixamos vaguear pelas formas redondas e antigas da cidade. Do outro lado da rua passam carros perigosamente velozes, a poluição é um problema como no império bizantino terão sido as invasões bárbaras. A união Europeia é um sonho e uma necessidade, mas os abusos dos direitos humano são outra realidade. O capitalismo desenfreado e as multinacionais cobrem a paisagem e tornam um pouquinho menos mágica a “Blue Mosque” saturada pela pesada pronúncia americana que ressoa por todos os cantos, como em outros tempos o fizeram as preces. É como se a história desse uma oportunidade a cada povo de ser verdadeiramente grandioso. Istambul teve mais do que a sua quota parte de grandiosidade tendo sido a capital de impérios durante milénios. Hoje vive decadente entre os seus palácios, as suas mesquitas e as ordes de turistas, à procura da sua identidade.

Istambul é ainda uma cidade que balança entre muitas religiões diferentes. Muçulmana por certo, mas também judia, católica e muito mais. As cabeças cobertas das suas mulheres revelam o facto que a Turquia teve como religião oficial o islamismo até meados do século passado. Das mesquitas soam ainda, 5 vezes por dias, as leituras árabes do Corão que chamam os fiéis para a oração do dia. Leituras que soam aos viajantes como música exótica e embalante. À austeridade do islamismo contrapõem-se outros fiéis, sem fez ou véus. Alguém me disse: “Nós não somos como os Árabes, partilhamos a mesma religião mas ela é para ser vivida como cada um sentir que a deve viver”. E assim é em Istambul, muita gente e muitos deuses caminham por aquelas ruas.

E por fim... Istambul é uma cidade na fronteira do sonho e da realidade. A vista dos minaretes da cidade cobertos pelo nevoeiro da madrugada, fazem-nos questionar se será apenas um sonho ou se estarão mesmo ali.

terça-feira, setembro 06, 2005

Vontade de sonhar



" "Onde estás?", pergunta-me ela. "Na torre mais alta de Yedicule? Que vês? - Toda a cidade, todo o mar, toda a terra..." Tantas simetrias, tantas forças contrárias, oscilações entre dois extremos, tanto caos, tudo enredado neste sobrevoo. Como se todas as idades do homem, os seus baixos e altos, se tivessem encontrado ali, todas juntas, no mesmo momento, e todas igualmente vivas, a Ásia e a Europa, frente a frente; como se o mundo se apoiasse neste ponto de equilíbrio sempre em ruptura, num silêncio de filme mudo."

Daniel Rondeau, "Istambul" (Publicações Europa-América)

DÁ VONTADE DE SONHAR, NÃO DÁ?

segunda-feira, setembro 05, 2005

Procedimento habitual

"ESTRAGON - O que é que nós lhe pedimos exactamente?
VLADIMIR - Não estavas lá?
ESTRAGON - Não devia estar a ouvir.
VLADIMIR - Oh... nada de concreto.
ESTRAGON - Uma espécie de oração.
VLADIMIR - Precisamente.
ESTRAGON - Uma súplica vaga.
VLADIMIR - Exactamente.
ESTRAGON - E o que é que ele disse?
VLADIMIR - Que logo via.
ESTRAGON - Que não prometia nada.
VLADIMIR - Que tinha que pensar no assunto.
ESTRAGON - No sossego da sua casa.
VLADIMIR - Consultar a sua família.
ESTRAGON - Os amigos.
VLADIMIR - Os agentes.
ESTRAGON - Os correspondentes.
VLADIMIR - Os livros.
ESTRAGON - A conta bancária.
VLADIMIR - Antes de tomar uma decisão.
ESTRAGON - É o procedimento habitual.
VLADIMIR - É, não é?
ESTRAGON - Acho que sim.
VLADIMIR - Eu também."

Samuel Beckett
À espera de Godot

domingo, setembro 04, 2005

A dignidade do homem

"We have given you, O Adam, no visage proper to yourself, nor endowment properly your own, in order that whatever place, whatever form, whatever gifts you may, with premeditation, select, these same you may have and possess through your own judgement and decision. The nature of all other creatures is defined and restricted within laws which We have laid down; you, by contrast, impeded by no such restrictions, may, by your own free will, to whose custody We have assigned you, trace for yourself the lineaments of your own nature. I have placed you at the very center of the world, so that from that vantage point you may with greater ease glance round about you on all that the world contains. We have made you a creature neither of heaven nor of earth, neither mortal nor immortal, in order that you may, as the free and proud shaper of your own being, fashion yourself in the form you may prefer. It will be in your power to descend to the lower, brutish forms of life; you will be able, through your own decision, to rise again to the superior orders whose life is divine.''

Pico della Mirandola em "Oration on the dignity of Man"

Bom dia!




Henry Cartier-Bresson

sábado, setembro 03, 2005

À bientôt

E há afinidades que nascem assim: sem que as procuremos e sem que as esperemos. É bom saber que no mundo há gente pela qual vale a pena parar e que vale a pena conhecer. Merci, K. J'espère de te rencontrer un jour. À bientôt.

"Noir dans le noir. Plus noir que le noir. Plus noir que le combat de nègres à minuit dans une cave, Je nái pas besoin, pour disparaître, de me cacher; je cesse seulement d'exister, et j'éteins mes phares. (...) C'est de la magie? Bien sûr. Croyez-vous qu'on soit noir à ce point, sans être sorcier?"

Colette, Autres Bêtes, "Chats de Paris"

quarta-feira, agosto 31, 2005

Poeta d' Orpheu, futurista e tudo

A pátria portuguesa segundo Almada Negreiros:

"Vós, oh portugueses da minha geração, nascidos como eu no ventre da sensibilidade europeia do séc. XX criai a pátria portuguesa do século XX.
Resolvei em pátria portuguesa o genial optimismo das vossas juventudes.
Dispensai os velhos que vos aconselham para vosso bem e atirai-vos independentes prà sublime brutalidade da vida. Criai a vossa experiência e sereis os maiores.
(...)
O Povo completo será aquele que tiver reunido no seu máximo todas as qualidades e todos os defeitos. Coragem Portugueses, só vos faltam as qualidades."

Em Ultimatum Futurista às Gerações Portuguesas do séc. XX (Dezembro 1917)

O que mudou?

terça-feira, agosto 30, 2005

Who are you?



Calvin por Bill Watterson

segunda-feira, agosto 29, 2005

Gatos!



"One small cat changes coming home to an empty house to coming home." - Pam Brown

É difícil explicar por que razão se gosta... Gosta-se. Apenas isso... Passeiam-se bamboleando a cauda, que depois poisam cuidadosamente à volta das suas patas, muito juntas, a suportar o corpo direito e imponente como uma estátua antiga. Tão senhores de si!... Vivem de acordo com as suas próprias regras enquanto emanam para o espaço que frequentam a tranquilidade do seu ronronar.

Pequenos felinos curiosos, representantes milenares de deuses, por mais que queiramos nunca vos iremos entender. Passaram-se milénios e encantaram culturas, apaixonaram artistas e gente comum, tornaram-se símbolos. Olhando para o seu corpo ágil e os seus olhos atentos e curiosos é fácil perceber porquê.

Bem vinda!

sexta-feira, agosto 26, 2005

Lomografia



De www.lomography.com


The 10 rules

01/ Take your camera everywhere you go
02/ Use it any time - day and night
03/ Lomography is not an interference in your life, but part of it
04/ Try the shot from the hip
05/ Approach the objects of your lomographic desire as close as possible
06/ Don't think
07/ Be fast
08/ You don't have to know beforehand what you capture on film
09/ Afterwards either
10/ Don't think about any rules

Artistas Unidos

Eduardo Pitta disse tudo (http://daliteratura.blogspot.com/2005/08/fechar-o-pano.html). Nada a acrescentar...

Cito:

"FECHAR O PANO?

Na próxima segunda-feira, dia 29, completam-se três anos sobre o despejo dos Artistas Unidos do espaço d'A Capital, no Bairro Alto. O intermezzo do Teatro Taborda também acabou. Agora os Artistas Unidos andam outra vez às bolandas. E Jorge Silva Melo pondera: «Estou muito hesitante. Não sei se não era melhor fecharmos daqui a pouco tempo, no Verão do próximo ano, cada qual ir para seu lado depois desta experiência em que amadurecemos e mostrámos do que éramos capazes. [...] Se calhar não dá o que pensei n'A Capital, ou dá outra coisa, já só com alguns. Ou nada, fecha-se a torneira e acabou-se.» (cf. DN de hoje) Para já, o grupo prepara-se para a digressão que começa no dia 3 de Setembro, na Guarda, com Music-Hall, de Jean-Luc Lagarce, e para uma nova co-produção com o Teatro Nacional D. Maria II, Os Animais Domésticos, de Letizia Russo. Enquanto isto, de cada vez que alguém deita um pardieiro abaixo, mil vozes se levantam em prol do «espaço cultural». Lisboa está pejada de espaços culturais que nunca acolheram uma exposição de pintura ou fotografia, um curso de escrita criativa ou de literatura comparada, uma venda temática de livros, uma leitura de poemas, uma sessão de piano ou jazz, uma performance teatral ou de bailado. Lisboa deve ser a única cidade europeia com meia-dúzia de teatros fechados (se calhar são mais, mas eu só me lembro de meia-dúzia), condenados às récitas de Natal das multinacionais que podem contratar palhaços para entreter os assalariados, ou ao ocasional monólogo de actores brasileiros de passagem, triste palmarés que reflecte a bacoquice indígena. Entre o Tivoli e o Taborda, dez anos de espectáculos, no primitivo lugar da livraria Ler Devagar, na Culturgest, no Politeama, no Variedades, na Comuna, na Gulbenkian, no Seixal, na mais distante província, no espaço que foi d'A Capital. Dez anos a revelar e a confirmar talentos (Américo Silva, António Simão, Carla Bolito, José Airosa, Manuel Wiborg, Miguel Borges, Paulo Claro, Pedro Carraca, Sérgio Grilo, Sylvie Rocha, etc.), a potenciar sinergias (Camacho Costa, Cecília Guimarães, Diogo Dória, Fernanda Montemor, Glicínia Quartin, Isabel de Castro, Lia Gama, Ricardo Carriço, Rogério Vieira, Teresa Roby, etc.), fiéis a uma programação de risco e, por isso mesmo, exigente. Who cares?"

segunda-feira, agosto 22, 2005

Poesia

Descobri que é preciso crescer mas se aprender a gostar de poesia... Tal como do vinho ou da música clássica. Tudo coisas que exigem tempo para ser apreciadas e degustadas. Quando somos mais novos andamos sempre a correr... Depois, vem um dia em que nos demoramos e descobrimos a beleza que antes nos escapava. É bom saber.


Há poetas que são artistas (por Alberto Caeiro)

E há poetas que são artistas
E trabalham nos seus versos
Como um carpinteiro nas tábuas!...
Que triste não saber florir!
Ter que pôr verso sobre verso, como quem constrói um muro
E ver se está bem, e tirar se não está!...
Quando a única casa artística é a Terra toda
Que varia e está sempre bem e é sempre a mesma.

Penso nisto, não como quem pensa, mas como quem respira,
E olho para as flores e sorrio...
Não sei se elas me compreendem
Nem sei eu as compreendo a elas,
Mas sei que a verdade está nelas e em mim
E na nossa comum divindade
De nos deixarmos ir e viver pela Terra
E levar ao solo pelas Estações contentes
E deixar que o vento cante para adormecermos
E não termos sonhos no nosso sono.

Chuva!

Às vezes pergunto-me onde irão buscar as nuvens tanta água para chover assim...

domingo, agosto 21, 2005

Enivrez-vous

Il faut être toujours ivre. Tout est là: c'est l'unique question. Pour ne pas sentir l'horrible fardeau du Temps qui brise vos épaules et vous penche vers la terre, il faut vous enivrer sans trêve.

Mais de quoi? De vin, de poésie ou de vertu, à votre guise. Mais enivrez-vous.

Et si quelquefois, sur les marches d'un palais, sur l'herbe verte d'un fossé, dans la solitude morne de votre chambre, vous vous réveillez, l'ivresse déjà diminuée ou disparue, demandez au vent, à la vague, à l'étoile, à l'oiseau, à l'horloge, à tout ce qui fuit, à tout ce qui gémit, à tout ce qui roule, à tout ce qui chante, à tout ce qui parle, demandez quelle heure il est; et le vent, la vague, l'étoile, l'oiseau, l'horloge, vous répondront: "Il est l'heure de s'enivrer! Pour n'être pas les esclaves martyrisés du Temps, enivrez-vous, enivrez-vous sans cesse! De vin, de poesie ou de vertu, à votre guise."

Charles Baudelaire

Nadie nos ha visto



Capricho 79 de Francisco Goya Y Lucientes

As amoras

O meu país sabe as amoras bravas
no verão.
Ninguém ignora que não é grande,
nem inteligente, nem elegante o meu país,
mas tem esta voz doce
de quem acorda cedo para cantar nas silvas.
Raramente falei do meu país, talvez
nem goste dele, mas quando um amigo
me traz amoras bravas
os seus muros parecem-me brancos,
reparo que também no meu país o céu é azul.

Sophia de Mello Breyner

quarta-feira, agosto 17, 2005

Fogo de Artificio





No outro dia houve fogo de artifício. Longo, belo e imponente. A fazer jus à riqueza da cidade e à honorabilidade dos que assistiam. Entre os “UUHH” e os “AAHH” dedicados às belíssimas figuras que se iam criando: às estrelas cadentes, às galáxias de planetas de todas as cores, com os seus anéis e as suas luas, às flores e às luzes faiscantes, os homens paravam para admirar o céu.

Foi apenas luz e pólvora, alguma cor, muito estrondo... Mas a cidade encheu-se de gente, parou-se o trânsito, fez-se a festa. Eram novos, velhos, bebés, de muitas cores, de muitos países, por certo de muitas religiões. Naquele momento apenas Homens. Comentava-se em surdina, porque a par das cabeças viradas para o céu nocturno, o ambiente encheu-se de uma religiosidade pagã e, como na igreja, as pessoas falavam baixinho, talvez acreditando que inspiração dos deuses não se incomoda.

E apesar de ser apenas luz e pólvora, os humanos são humanos, com o seu gosto pelas coisas belas e os seus “AAHH” e “UUHH” universais. E não foi por causa das crianças como eles diziam, que eu bem os vi... Barbudos, do alto dos seus 50 anos, então 5, com um sorriso maravilhado sob o céu colorido! Vi-os enquanto eu própria não consegui conter a admiração pela cascata de ouro que surgira à minha frente. E um dos “AAHH” foi meu!

Uma pausa a meio da tarde

Porque a vida num escritório consegue ser surreal...


Dilbert por Scott Adams

terça-feira, agosto 16, 2005

Sem amarras

Não têm vontade de partir agora mesmo e correr mundo?

"Travel is fatal to prejudice, bigotry and narrow-mindedness, and many of our people need it sorely on these accounts. Broad, wholesome, charitable views of men and things can not be acquired by vegetating in one little corner of the earth all one's lifetime. " Mark Twain

segunda-feira, agosto 15, 2005

Zap Mamma

Há músicas a que nós associamos estados de espírito, alturas do dia ou até mesmo estações do ano. Neste sentido, os Zap Mamma são uma festa na praia num dia quente de Verão. Com origens entre África e Bruxelas são a ponte que nos faz viajar por locais que embora não nos sejam totalmente desconhecidos, nos obrigam a estar alertas porque não são de todo comuns. São também uma prova de como as misturas, neste caso de cultura e ritmo, podem produzir resultados absolutamente inesperados.

Os Zap Mamma são assim: solarengos, cheios do calor amistoso que trazem das suas terras africanas e com muita irreverência. Se tiverem oportunidade percam um bocadinho a ouvir o disco A Ma Zone. Parem na música "Gissie" ou talvez na "Gbo Mata" e depois digam... se não pensaram que tinha que ser Verão com uma música assim.

Enjoy!

Para pensar...

"A mind once stretched by a new idea never regains its original dimensions." Anónimo

domingo, agosto 14, 2005

Tenham uma boa semana!

O fim do Verão

Enquanto Portugal goza ainda do calor (intenso!) destes dias de meados de Agosto, aqui o Verão começa a tornar-se numa recordação. Não muito distante é certo, mas já uma recordação. As baixas temperaturas e a chuva miudinha fazem-nos lembrar que o tempo de tirar os casacos e as luvas dos armários não virá longe.

Claro que este tempo Outonal precoce tem as suas belezas... como as de um chá quente no sofá enquanto se assiste a um filme na televisão, tendo como música de fundo a chuva a bater nos vidros.

Se ao menos eu pudesse mandar um pouquinho desta chuva também para as terras ressequidas dos nossos campos!!!...

Better together

"It's not always easy and sometimes life can be deceiving
I'll tell you one thing, it's always better when we're together

(...)

And all of these moments just might find their way into my dreams
tonight
But I know that they'll be gone when the morning light sings
Or brings new things for tomorrow night you see
That they'll be gone too, too many things I have to do
But if all of these dreams might find their way into my day to day scene
I'd be under the impression I was somewhere in between"

Extracto da música "Better together" de Jack Johnson (Album "In Between Dreams")

Delicatesse?

Deixem-me em poucas explicar o que pretende ser "Délicatesse"...

As "Délicatesse" são lojas que preparam para os seus clientes, entre outras coisas, comida invulgar ou de locais distantes. Esta "Délicatesse" é o espaço através do qual eu quero partilhar convosco os pequenos detalhes com que me vou deparando, que tornam os locais distintos e as pessoas diferentes, que fazem com que distinga os dias e os meses, que me deixam surpresa ou simplesmente me arrancam um sorriso. Pequenos detalhes que me fazem saborear os dias que passam.

Cheguei à conclusão que a vida pode ser passada a correr de um lado para o outro, desde que de vez em quando paremos para observar, respirar fundo e continuar. Para saborear as comidas invulgares na esquina do nosso bairro, ou os cheiros distantes de qualquer sítio deste mundo. Assim sendo, resolvi dormir menos e prestar mais atenção àquilo que me rodeia... Este vai ser o local onde irei armazenar essas minhas viagens e reflexões.

Mas espero ainda e principalmente que "Délicatesse" seja uma ponte. Entre mim e vós. Porque apesar de distantes continuam a fazer parte da minha vida. Que esta ponte assegure que nenhum tempo ou distância nos tornam estranhos.