quinta-feira, novembro 03, 2005

Porque há vidas intemporais...

Imaginem o José António Saraiva. Conseguem imaginar? O velho senhor que dá lições de história a senhoras improváveis. Pois bem... agora imaginem o mesmo José António Saraiva na figura de uma jovem extrovertida, a rondar os seus 90 anos e a falar francês numa velocidade pouco saudável para tão avançada idade. Os gestos têm a mesma expressão algo exagerada, mas a voz, a jovialidade, a empolgamento com que fala e que se sente vibrar em cada palavra que diz, são uma espécie de espectáculo em si mesmo que nos mantém presos, sem noção do tempo que passa... "Vocês têm que se imaginar no estúdio do Delacroix, espadas e sabres por todo o lado e as concubinas e a bela Simone. Não imaginam o que ele dizia no seu diário sobre a bela Simone, que pousava para ele por oito francos. Têm que estar lá se querem compreender. Toda a arte está localizada num tempo. Se a querem compreender têm que compreender as preocupações dos artistas, conhecer os seus amigos, as cidades por onde caminhavam, as conturbações políticas, religiosas, as modas. É por isso que eu preciso de vos explicar tudo isto."

Belo, não é? A idade não tem faces ou rugas ou tempos. Mesmo se se fazem esboços em vez de se tirarem fotografias, mesmo se se conduz um carro apenas com duas mudanças ( a saber, 1a e 2a), mesmo se depois de insinuações menos próprias sobre Delacroix e a devassidão do seu estúdio se diz com o ar mais sério do mundo: "Meninas da sua idade não podem andar sozinhas a esta hora na rua". Porque o tempo era outro e estávamos outra vez no séc. XXI. No entanto, havia um brilho no olhos e uma empolgamento na voz que não enganava ninguém. A vida é intemporal e instintivamente reconhecemos aqueles que conseguem viver plenamente essa sua característica...

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